«-Não foi só o cavalo
amarelo que se espantou, Pedro. Espantaram-se os quatro. Foi por isso que
fugi…» (p. 288)
A citação acima justifica o título do romance.
Pedro e Jadwiga referem-se aos cavalos dos Cavaleiros do
Apocalipse: branco, Peste; vermelho, Guerra; negro, Fome e amarelo, Morte
(destruindo pela fome, pela guerra e pela peste).
Alves Redol, apesar de ser considerado um dos marcos do
neorrealismo português, neste romance dedica-se mais à análise psicológica das
personagens, através de uma estratégia de narração que, penso, na altura era
algo invulgar: as três personagens principais narram alternadamente a sua visão
dos factor, existindo ainda um narrador fora da história. Isto permite a objetivação dos diferentes pontos de vista e um conhecimento mais íntimo das
personagens.
Redol apresenta no prólogo do romance uma explicação sobre
a envolvência da história e caracteriza desde logo as personagens principais,
aliás titula este prólogo de “o escritor antecipa-se e fala das personagens
antes que outros as encontrem e conheçam”.
Assim, as personagens são Leo e Jadwiga, casal de judeus
austríacos fugidos da ameaça nazi, e Pedro, secretário de um consulado numa
Lisboa «de aparência sonolenta,
entroncamento de foragidos e espiões, vindos à babugem de sol e de sossego.»,
que apõem vistos de permanência nos passaportes deste casal apesar de ter
praticamente a certeza de que são documentos falsos.
Eis um extracto da caracterização destas personagens feita
pelo autor:
«Três personagens,
dizia eu: dois homens e uma mulher na teia das frustrações…»
«…A mulher, austríaca
[…] cabotina e inquieta, loura, talvez bonita por causa dos seus olhos verdes…»
para quem «a literatura é também
agradável sedativo…»
Pedro, «homem
taciturno, contraditório, ora abúlico, ora exaltado, quase sempre dramático,
vivendo entre uma inteligência serena, rigorosa na aparência, e os instintos
que a destruíam quando se soltavam da prisão construída por aquela.» Assim,
«deambula entre o querer e o dever».
«Leo, homem de
negócios, fora dos seus negócios é o marido, às vezes ciumento e ainda
apaixonado pela mulher.»
Ora esta nunca o quis, apenas aceitou casar com ele para
fazer a vontade ao pai, importante banqueiro judeu. Estão juntos apenas pela
necessidade de viajarem como casal, pela compra daqueles passaportes falsos.
Ela tenta -aparentemente chega mesmo a apaixonar-se por Pedro-, que
este lhe corresponda, mas ele consegue, neste caso, sobrepor a razão aos
sentimentos, pois também ele a ama: «Nem
um triângulo amoroso soubemos fazer.»
O livro é muito interessante do ponto de vista da análise
de caracteres, mas também em relação à descrição do ambiente lisboeta na
eminência da II Grande Guerra.
REDOL, Alves. O Cavalo Espantado. Portugália Editora, 1960
REDOL, Alves. O Cavalo Espantado. Portugália Editora, 1960
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