Serve este livrinho também de pretexto para falar da Colecção Imbondeiro, que valorizou a literatura
colonial, e em que muitos dos escritores africanos, hoje incontornáveis, viram
publicadas as suas obras, nomeadamente Luandino Vieira (pseudónimo de José
Vieira Mateus da Graça, n. em 1935),
A coleção, editada em Sá da Bandeira – atual Lubando – Angola
tem pelo menos 68 números e foi dirigida por Garibaldino de Andrade (1914-1970)
e Leonel Cosme (n. 1934). Divulgou obras de autores das ex-colónias portuguesas
e também do Brasil mesmo do continente.
Gabriel Mariano (pseudónimo de José Gabriel Lopes da Silva,
1928-2002).
Transcreve-se da nótula inserida n’O Rapaz Doente (1963):
«Gabriel Mariano é natural de Vila da Ribeira Brava (S.
Nicolau), onde nasceu em 1928. Tirou o curso liceal em S. Vivente e o curso de
Direito na Universidade de Lisboa. Desempenha as funções de Conservador do
Registo Predial em S. Tomé. Colaborador do boletim “Cabo Verde” e da revista “Claridade”, tem ainda poemas e contos dispersos por vários
jornais. Participou com uma comunicação nos Colóquios de Estudos Cabo-Verdianos
que em 1959 se realizaram em Lisboa sob os auspícios da Junta de Investigações
do Ultramar.»
Posteriormente publicou, v.g.: Vida e Morte de João
Cabafume (1976).
O RAPAZ DOENTE
Júlio, um rapaz da Praia, vem a S. Vicente, enviado pelo
marido de D. Maninha, na tentativa de obter tratamento para uma doença
contagiosa não mencionada (provavelmente tuberculose). A sua doença terá tido
origem em S. Tomé onde as condições de trabalho eram inenarráveis. Conta-nos as
diligências e o medo de D. Maninha- Por um lado quer obsequiar a vontade do
marido, por outro teme que, se der guarida por uma noite que seja a Júlio, os
seus filhos possam ser contagiados.
Da triste narração fica também a hipocrisia das relações
entre os mais afortunados e os pobres, que aceitam resignados o seu destino, não
tendo estes outra hipótese senão vaguear, possivelmente contagiando outros, e
morrer na solidão.
Diz o enfermeiro a quem D. Maninha solicita ajuda:
«- Sabe, minha senhora, a culpa não é nossa… São ordens… E
ia acrescentando pesaroso que todos os dias apareciam casos como aquele: tudo
quanto se fazia era dar consulta e receitar. Se o doente pudesse tratava-se, se
fosse pobre… paciência.»
MARIANO, Gabriel. O Rapaz Doente. Imbondeiro, 1963.