Notas de algumas leituras, sem pretensões de crítica literária.

Seleção de alguns poemas, com ou sem comentários.


quinta-feira, 21 de janeiro de 2016

O RAPAZ DOENTE, Gabriel Mariano


Serve este livrinho também de pretexto para falar da Colecção Imbondeiro, que valorizou a literatura colonial, e em que muitos dos escritores africanos, hoje incontornáveis, viram publicadas as suas obras, nomeadamente Luandino Vieira (pseudónimo de José Vieira Mateus da Graça, n. em 1935),

A coleção, editada em Sá da Bandeira – atual Lubando – Angola tem pelo menos 68 números e foi dirigida por Garibaldino de Andrade (1914-1970) e Leonel Cosme (n. 1934). Divulgou obras de autores das ex-colónias portuguesas e também do Brasil mesmo do continente.


Gabriel Mariano (pseudónimo de José Gabriel Lopes da Silva, 1928-2002).

Transcreve-se da nótula inserida n’O Rapaz Doente (1963):

«Gabriel Mariano é natural de Vila da Ribeira Brava (S. Nicolau), onde nasceu em 1928. Tirou o curso liceal em S. Vivente e o curso de Direito na Universidade de Lisboa. Desempenha as funções de Conservador do Registo Predial em S. Tomé. Colaborador do boletim “Cabo Verde” e da revista “Claridade”,  tem ainda poemas e contos dispersos por vários jornais. Participou com uma comunicação nos Colóquios de Estudos Cabo-Verdianos que em 1959 se realizaram em Lisboa sob os auspícios da Junta de Investigações do Ultramar.»

Posteriormente publicou, v.g.: Vida e Morte de João Cabafume (1976).


O RAPAZ DOENTE
Júlio, um rapaz da Praia, vem a S. Vicente, enviado pelo marido de D. Maninha, na tentativa de obter tratamento para uma doença contagiosa não mencionada (provavelmente tuberculose). A sua doença terá tido origem em S. Tomé onde as condições de trabalho eram inenarráveis. Conta-nos as diligências e o medo de D. Maninha- Por um lado quer obsequiar a vontade do marido, por outro teme que, se der guarida por uma noite que seja a Júlio, os seus filhos possam ser contagiados.
Da triste narração fica também a hipocrisia das relações entre os mais afortunados e os pobres, que aceitam resignados o seu destino, não tendo estes outra hipótese senão vaguear, possivelmente contagiando outros, e morrer na solidão.

Diz o enfermeiro a quem D. Maninha solicita ajuda:
«- Sabe, minha senhora, a culpa não é nossa… São ordens… E ia acrescentando pesaroso que todos os dias apareciam casos como aquele: tudo quanto se fazia era dar consulta e receitar. Se o doente pudesse tratava-se, se fosse pobre… paciência.»

MARIANO, Gabriel. O Rapaz Doente. Imbondeiro,  1963.