O livro é composto por vários segmentos, aparentemente sem
grande coesão. Estes, tal como consta da nota final, dividem-se em
predominantemente descritivos, narrativos ou meditativos, sendo que todos
incluem as três vertentes.
O sr. Palomar, nome motivado pelo observatório homónimo em
San Diego, Califórnia, observa o mundo que o rodeia: objetos, animais, seres
humanos.
O sr. Palomar vai interrogando as suas observações e os
seus pensamentos sobre elas. As várias hipóteses que lhe são presentes não
resolvem os problemas em causa.
Há momentos em que decide restringir-se ao observável:
«Mas
talvez seja exactamente essa desconfiança em relação aos nossos sentimentos que
nos impede de nos sentirmos à vontade no universo. Talvez a primeira regra que
me devo impor seja: ater-me ao que vejo.» (p. 47)
Outras vira-se para dentro de si ou tenta colocar-se fora
si para se observar, como na velha perspectiva de alguém que está à janela a
ver-se passar a si próprio.
Vezes há ainda em que os automatismos civilizacionais levam
a melhor sobre as suas intenções, como, quando, depois de esperar algum tempo
para ser atendido numa loja de queijos em Paris, e aproveitando o tempo de
espera para tentar dominar a nomenclatura dos espécimes expostos, acaba por
pedir o óbvio, o que os turistas pedem, e não aquilo que pensava ter de
experimentar. (p. 79-82)
No fim, há pelo menos duas mensagens interessantes:
primeira, antes de se ter quaisquer pretensões a conhecer o mundo / universo, “conhece-te
a ti mesmo”; segundo, provavelmente quando alguém tentar ser de tal modo isento
que só lhe reste fazer de morto, morrerá.
Sumariando, o sr. Palomar não é totalmente objetivo, mas
tenta sê-lo, só que enferma de uma tendência insuperável para problematizar o
que vê, o que pensa que vê, o que pensa que pensa… Assim, todas as suas
observações resultam em paradoxos. Ele acaba desiludido, porque, quando julga
que poderá ter captado o essencial do problema e vislumbrar uma explicação
compreensiva do funcionamento do mundo, vê que está perdido.
Uma outra vertente a explorar é a crítica a vários aspectos
da nossa sociedade, que está disseminada pelos vários segmentos.
Por exemplo:
Renúncia ao saber livresco: Ao observar Júpiter «…tem de permitir à sua imaginação que se
dispa das roupagens que não são as suas, que renuncie a exibir um saber
livresco.» (p.47).
Às maleitas das instituições públicas e aos que delas vivem: falando sobre os pombos «…uma progénie degenerada e imunda e infecta
que não é doméstica nem selvagem, mas que está integrada nas instituições
públicas e, como tal, é inextinguível.» (p. 59)
O livro é interessante de ler, mas não fácil,
principalmente se se investir em compreender todos os problemas que o autor nos
coloca, através das observações do sr. Palomar. As descrições são muito interessantes
e de uma incrível minúcia. É um livro
para muitas leituras. Impossível esgotar o seu sentido com uma só leitura.
Nota: As páginas referem-se
à edição da Teorema, 2009.