«…não há melhor pedra de amolar
lâminas do que a letra impressa.» (p.226)
Arturo
Pérez-Reverte parece querer lutar contra a tacanhez, a ignorância, a
resistência à mudança e ao progresso, valorizando a honra e a lealdade, assim
como conhecimento manifestado à época pelos militares mais ilustrados. Por
outro lado, critica fortemente o poder dos reis e dos nobres que ignoram e
maltratam aqueles que governam, pelos quais deviam velar e providenciar para
que as suas vidas fossem menos duras. O autor aproveita também para indiciar a
Revolução Francesa que se aproximava…
As críticas ao
passado acima referidas valem, sem dúvida, também para as estruturas
governativas do nosso tempo.
É facto que na
biblioteca da Real Academia Espanhola existe una coleção completa da Encyclopédie, ou dictionnaire raisonné des
sciences, des arts et des métiers… publicada por M. Diderot … e M.
D’Alembert. É a partir desta descoberta que o autor homenageia a Academia Espanhola,
da qual faz parte desde 2003, e cria este romance histórico que, para além do
valor intrínseco da história em si, vale também pela reflexão integrada no
texto do seu processo de criação e construção, invocando pesquisas para este e para
romances anteriores, assim como o recurso a uma bem fornecida biblioteca
pessoal. Nesta perspetiva podemos mesmo falar de um metaromance, ou seja: um
romance que pensa o romance.
Recria os
costumes de Paris no século das luzes e, talvez por isso, aí decorre grande
parte da ação, colocando os dois «homens bons», acompanhados de um seu
compatriota, padre e revolucionário, em vários dos lugares em que se discutia o
presente e o futuro das ciências e das sociedades, comparando amiúde a situação
de Espanha com a de França.
Na parte final
parece um pouco forçada a maneira como se preservam os 28 volumes da
Enciclopédia, no entanto o desenlace acaba por ser bem conseguido, pois os
livros apenas se salvam devido à coragem de quem nunca se esperaria e ao apego
à pele do bandido encarregado de boicotar a missão dos dois membros da Academia
Espanhola.
SINOPSE do editor: «Na Europa do século
XVIII, dois homens viajam em segredo. A sua missão? Levar para Espanha algo
proibido: os 28 volumes da Enciclopédia Francesa de D'Alembert e Diderot. A
delicada tarefa está nas mãos do bibliotecário don Hermógenes Molina e do
almirante don Pedro Zárate, membros da Real Academia Espanhola. Mas estes dois
académicos estão longe de imaginar as peripécias que os aguardam… Da Madrid de
Carlos III à Paris libertina e pré-revolucionária, com os seus cafés e
tertúlias filosóficas, don Hermógenes e don Pedro embarcam numa intrépida aventura,
repleta de heróis e vilãos, intrigas e incertezas. Com o rigor a que já nos
habituou – e baseando-se em acontecimentos e personagens reais, Arturo
Pérez-Reverte transporta-nos para a magnífica era do Iluminismo, quando a ânsia
de liberdade derrubava a ordem estabelecida, e dá-nos a conhecer os heroicos
homens que quiseram mudar o mundo com os livros. Um romance sobre fé e razão,
Teologia e Ciência, sombra e luz.»
PÉREZ-REVERTE,
Arturo. Homens bons. Asa, 2016
Sem comentários:
Enviar um comentário
Idealmente, discorde, comente, esclareça a interpretação do texto ou livro em apreço.