SACHA, Francisco López. A CASA DO SOL
NASCENTE
Justificação da antologia. Resenha sobre o conto cubano e
marcos importantes na evolução deste género. Estes contos ilustraram a produção
de c. 1980 a 1994.
Durante este período são relevantes três fases distintas.
«Qualquer
um dos relatos deste livro pode constituir um bom exemplo do estado atual do
conto cubano. A antologia avança por ordem cronológica, de acordo com as datas
em que surgiram os contos ou os autores. Paz, Díaz, Heras León e Maria Elena
Llana representam o início da década, até 1984. Neles predomina o olhar da
criança e do adolescente, a exposição de um conflito íntimo e, por vezes, a
rutura da lógica da realidade. São relatos precisos, fechados em si próprios,
com ligeiras ondulações internas que conduzem a um tema que ultrapassa os
limites da história. A partir de Montero, entramos já no fim da década. Os
autores que se seguem, com a única exceção de Aida Bahr, situam-se entre 1986 e
1990, e os contos de Prieto, García, Viera, Arango, Yáñez. Padura e Vidal são
os mais exatos na abertura ao quotidiano ou, em todo o caso, na revelação de
uma realidade intacta, matizada pelo absurdo, a violência ou o insólito. Abilio
Estévez é um bom dramaturgo […]. Com Miguel Collazo passamos a fronteira dos
anos 90 e os contos de Bobes, Garrido, Mejias e Angel Santiesteban integram-se
nas vias de rutura que correspondem ao momento atual.»
PAZ, Senal. À SOMBRA DO SALGUEIRO.
A vida vista pelos olhos de uma criança.
Atento e observador gosta da sua família, mas não lhe
escapam as diferenças de tratamento que avós e tias dão à mãe e ao pai que
ainda não conhece.
É grande a sua expectativa quando lhe dizem que finalmente
o vai conhecer. Maior é o seu desapontamento e desgosto, quando este o ignora,
descartando a apresentação, que o pequeno tanto esperou, com um comentário
sobre a parecença com a mãe.
DÍAZ, Jésus. FEIRA POPULAR.
Numa barraca de feira, um rapaz observa uma rapariga
sentada numa prancha suspensa sobre a água fria, em que terá que mergulhar, se
alguém acertar, atirando uma bola, na chapa que aciona o mecanismo que provoca
a queda. Este gasta o seu dinheiro e não consegue derrubá-la. É demasiado
jovem, apesar de uma vez ter acertado não teve a força necessária para que o
mecanismo funcionasse. O que ele pretende é captar-lhe a atenção. Não o
consegue.
Vem um pitcher de
basebol americano bêbado que derruba a rapariga pelo menos vinte vezes. Segundo
os amigos delapidava o seu capital,
não o dinheiro, sim o braço. O rapaz, apesar de ser fã do americano, indigna-se
por ele ser tão cruel com a rapariga, que ele julga amar. Mostra-se ainda
indignado porque a rapariga resistiu a tudo, sem uma queixa sem uma revolta,
com grande determinação, pois preferiria que ela fosse humilhada.
MEJIDES, Miguel. A MINHA PRIMA AMANDA.
As recordações de infância e uma certa necessidade de as
esconjurar. Vidas falhadas por motivos insignificantes. Influência da cultura
americana.
LEÓN,Eduardo Heras. FIM DE DIA.
Fim de dia de um casal de operários cuja relação enferma de
um qualquer problema que não enxergo. Aparentemente dão-se bem, no entanto ela
não está a trabalhar, pois ele diz-lhe que na fábrica sentem a sua falta. Ela
parece desejar um filho, mas repele-o, ainda que meigamente, assim que ele
pretende acariciá-la, o que ele parece aceitar sem grande dificuldade.
LLANA, Maria Elena. EM FAMÍLIA.
Um espelho que reflete os mortos da família leva a
narradora a questionar qual dos dois lados é real. Os dois mundos não são
completamente estanques. Não é explicado, mas o mundo dos mortos governa o dos
vivos, pois a personagem que contatou com o lado de lá teve morte imediata,
mas, naturalmente, se tal não acontecesse, morreria também, implicitamente,
mais tarde.
MONTERO,
Reinaldo. “HAPINESS IS A WARM GUN”, CARY SAYS.
Uma história em forma de longa pergunta. Que farias se?
Aparentemente um grupo de jovens engata um homem uns quinze
anos mais velho para o defraudar, o burlar a qualquer momento. Estamos sempre à
espera de que tal aconteça: no pagamento das bebidas; no pagamento do táxi; na
consumação de uma relação amorosa, etc. Nada. Finalmente só tem que entregar
uns artigos a alguém que os espera. São estes artigos roubados? Há aqui
qualquer espécie de tráfico? …?
PRIETO, Abel. DE ESTUPIÑÁN E DA AMIBA.
A luta de um hipocondríaco, Estupiãnán, contra a amiba que
lhe mina as entranhas. Esta leva-o ao isolamento, a descurar a vida
profissional, social e familiar.
Vai de férias. Todos pensam que se ensimesmaria ainda mais.
Um conhecido traz a notícia de que o encontrara a beber na companhia de uma
mulher com a qual lhe afirmara que iria reconstituir a sua vida. O fim
apresentado não resolve nada. A sugestão parece ser apenas de que até aquele
que nos parece ter um comportamento absolutamente previsível é capaz de nos
surpreender.
GARCÍA, Luis Manuel. O VENDEDOR DE
BORBOLETAS.
O soldado-máquina, que cumpre a sua missão sem que algo o
possa demover, contra o louco que sobrevive a um ataque acidental ao hospital
que o alojava. A borboleta que pretende vender ao soldado não é moeda de troca
aceitável.
O soldado julgando-se ameaçado mata o louco. A morte deste
desencadeia todo o género de catástrofes. Supõe-se que no mundo do soldado
americano.
BAHR, Aida. IMPERFEIÇÕES.
A velhice demencial de uma avó que já perdeu o seu
companheiro e que o procura do outro lado do espelho, de um qualquer espelho,
que lhe devolve progressivamente uma imagem mais jovem de si própria e depois a
faz imaginar o amplexo do seu amado, que não é naturalmente mais do que o ato
de ser agarrada pelos seus familiares que a forçam a deitar-se.
VIERA, Félix Luis. ABELARDO E O RÁDIO.
Temos novamente, um narrador jovem. É um jogador de
berlinde, vigarizado por um dos outros rapazes, Abelardo. O primeiro, perante uma
vantagem evidente, da qual poderia tirar grandes dividendos, perante a
possibilidade de ele próprio se tornar um canalha, hesita.
ARANGO, Arturo. O ESTÁDIO.
Um jogador medíocre de basebol, mas com grandes ambições,
de súbito constata que não tem as qualidades necessárias para ser um bom
jogador.
Convidado a explorar o quiosque de tabaco do estádio, vai
de passo em passo descobrindo, através da audição, dos aplausos, das vaias, das
exclamações o que se passa no campo. Mais tarde vai ainda mais longe. Apercebe-se
de que o estádio é um pequeno universo que tem leis próprias e que qualquer
acontecimento de somenos importância o afeta. Veio também a compreender os
meandros do submundo das apostas e a conseguir identificar os seus
protagonistas.
Até que um neto seu entra no campeonato e ele começa a
tentar usar conhecimentos adquiridos ao longo de muitos anos para influenciar
os resultados (com pequenas ações quase despiciendas). No entanto, o seu neto
não se revelou “a segura promessa” inicial e a sua equipa não melhora.
No campeonato seguinte age de forma dissimulada sobre os
acontecimentos, mas mais violenta: inundações, falhas de eletricidade, etc.
Embora depois tente voltar a um perfil não interventivo,
apenas de recetor do pulsar do estádio, este força-o a ações ainda piores de sabotagem do jogo.
Até que o estádio lhe exige
o sacrifício supremo…
YÁÑEZ, Mirta. KID BURURÚ E OS CANIBAIS.
Num percurso de autocarro que a leva através dos lugares
que marcaram a sua vida, a narradora, que faz quarenta anos, medita sobre
quando começa a velhice. Vai também analisando as pessoas que frequentam o 19 à
medida que entram e saem,
Assiste a um episódio de abuso sobre um velho pugilista,
Kid Bururú, por alguém que lhe fora próximo.
A viagem de autocarro e os acontecimentos a que assiste
levam-na a uma melhor compreensão de si própria.
PADURA, Leonardo. O CAÇADOR.
Há como que a sugestão de que estamos perante uma mulher
que demoradamente se pinta e depois repentinamente remove toda a maquilhagem, O
equívoco logo à frente se percebe. Trata-se de um homem. Este prepara-se para
uma noite de caça, deixando à sorte o terreno onde exercerá essa caça. Tomará o
primeiro autocarro que o destino lhe enviar.
O conto refere-se a lugares e modos de engate, assim como a
diferentes comportamentos de homossexuais.
Percebemos que o protagonista se vê, na sua angústia e
solidão, perto do suicídio. Ironicamente parece incapaz de o concretizar,
porque exigiria uma grande sujeira.
VIDAL, Guillermo. O QUE É A FELICIDADE?
Três páginas de difícil compreensão. Há uma fotografia em
que um homem se esvai em sangue. O narrador vai conjeturando sobre aqueles que
estariam atrás de quem aciona o obturador. No final intui-se que esta é uma
situação muitas vezes repetida: Alguém que é morto por se opor a um regime?
Violência gratuita!?
Fragmento da realidade… absurdo…
ESTÉVEZ, Abilio. ENVIADO DE OUTRO MUNDO.
Conto carregado de simbolismo.
Libertação da presença de um marido defunto pelo
aparecimento de um homem que supostamente vem do outro mundo.
Este é enviado pelo morto, que é feliz na sua nova
situação, para que trate da sua família.
O narrador é o filho que nos mostra as reações da mãe: da
assunção de que o homem é o diabo, até à aceitação de que lhes está a ser dada
a oportunidade de voltarem a ser felizes.
COLLAZO, Miguel. UM CASO BICUDO NO NIAGARA.
Sobre a inclemência do sol cubano, dois homens falam sobre o
modo como para cativar turistas se elide a sujidade e a miséria do povo. A
conversa evolui para um problema jurídico da posse de uma construção sobre o
terreno de outrem. Em grande parte parece um diálogo de surdos, embora um
esteja definitivamente a tentar ajudar o outro.
O leitor vislumbra os meandros das dificuldades jurídicas
em Cuba.
Depois de muita conversa o problema subsiste, a solução é
protelada. Mas mais um copo, para refrescar o corpo e reduzir a angústia, vem
mesmo a calhar.
BOBES, Marilyn. PERGUNTA A DEUS.
Mulher que casa com um turista francês mostra como Cuba
acaba por ter mais valor e encanto de que a Toulouse para onde o marido a levou.
GARRIDO, Alberto. O BRAÇO E A TELA.
Partindo da Guernica de Picasso divaga sobre braços
amputados, sobre outros quadros e pintores, sobre a guerra…
MEJÍAS, Rolando Sánchez. A NOITE DO MUNDO.
Uma mulher interroga-se sobre a importância da sua
existência, sobre a sua relação com a rede de serem que a conformam.
O narrador salta para a breve história de uma dessas
relações: o rapaz que no cinema se atreveu a acariciá-la e logo depois para um
oleiro que também faz perguntas sobre a existência e a sua relevância.
SANTIESTEBAN, Angel. SUL: PARALELO 13.
Um grupo de soldados cubanos em Angola é atacado por um
avião. Forçados a regressar a pé à base com feridos, não conseguem encontrar
facilmente o caminho. Entre eles há um violinista cujas ações são estranhas
para todos: prefere tocar a comer, protege mais o instrumento que o seu corpo.
Encontram uma casa, no meio do mato, de portugueses que
lhes dão alguma assistência e, depois, lhes propõem trocar o violino por
medicamentos e alimentos. O capitão obriga o soldado violinista a entregar o
instrumento. O violinista segue-os sem dizer nada, mas todos se sentem
culpados. Voltam a trás para recuperar o violino à força.
O capitão entrega o violino ao soldado, repreende-o e
apreende-lhe a arma. Este pega no violino e afasta-se.
No fim do livro há um ficheiro com uma pequena nota biográfica sobre
cada um dos escritores incluídos na antologia.